Anistia em regime de urgência: Hugo Motta leva projeto ao plenário e escolhe Paulinho da Força como relator

Anistia em regime de urgência: Hugo Motta leva projeto ao plenário e escolhe Paulinho da Força como relator

Urgência aprovada e o jogo político por trás da anistia

O comando da Câmara pisou no acelerador. Após reunião com líderes partidários na residência oficial, o presidente Hugo Motta (Republicanos-PB) confirmou que o plenário aprovou, por 311 a 163, o pedido de urgência para o projeto que concede anistia a envolvidos nos atos de 8 de janeiro de 2023 e em manifestações de cunho político e/ou eleitoral a partir de 30 de outubro de 2022 — data do segundo turno. Na mesma tacada, ele escolheu Paulinho da Força (Solidariedade-SP) para relatar o texto.

Motta fala em “pacificação” e em virar a página. Urgência significa encurtar etapas e levar a proposta direto ao plenário, sem a fila tradicional de comissões. A leitura política é direta: a oposição quer votar logo, com apoio articulado por nomes do Republicanos e do PL, e com a participação ativa de lideranças do centrão. O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), entrou nas conversas e atuou para azeitar apoios, de olho também no xadrez de 2026.

O projeto é de autoria do deputado Marcelo Crivella (Republicanos-RJ). No desenho original, a anistia é ampla e geral, cobrindo atos e manifestações relacionados à disputa eleitoral e a embates políticos ocorridos desde o fim do segundo turno. A oposição não esconde o objetivo: alcançar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e uma fatia de investigados e processados por 8/1. Do outro lado, partidos governistas e parte do centro querem um filtro mais duro para não premiar vandalismo, depredação e financiamento de ataques às instituições.

Paulinho da Força assume a relatoria numa posição sensível. Ele tem trânsito com ministros do Supremo, faz críticas ao governo Lula quando quer marcar posição e defende a construção de uma candidatura de centro para 2026. Esse arranjo sugere um parecer de meio-termo: anistia “política”, mas com exclusões claras para quem comandou, financiou ou praticou violência e dano ao patrimônio.

A pressão para avançar cresceu nas últimas semanas com decisões judiciais e o andamento de processos que atingem aliados do bolsonarismo. Investigados e articuladores da proposta dizem que, sem uma resposta do Congresso, as penas seriam desproporcionais e manteriam a sociedade em conflito. Críticos rebatem que anistiar sem critério seria empurrar para debaixo do tapete crimes contra a ordem democrática.

Para entender a urgência: com o regime aprovado, a Mesa pode pautar o mérito a qualquer momento. O rito fica mais curto e previsível, e negociações acontecem até a véspera da votação. Na prática, o relator passa a ser o polo de barganha: ele recolhe emendas, conversa com bancadas e fecha um texto capaz de juntar 257 votos ou mais.

  • Sem urgência: projeto percorre comissões temáticas e Constituição e Justiça, com prazos e audiências.
  • Com urgência: vai direto ao plenário, pode ser votado em dias, e acordos são costurados no relatório.

O pano de fundo é 8 de janeiro. Milhares foram investigados, e centenas já foram julgados por participação, financiamento, vandalismo e incitação. O STF tem aplicado penas em série para quem invadiu, depredou ou atuou na logística dos ataques. Parlamentares de oposição alegam que houve excesso em casos de réus que não praticaram violência, mas estavam nas imediações ou participaram de atos sem destruir nada. A base governista e juristas alinhados à responsabilização discordam: entendem que a tentativa de romper a ordem democrática exige punição exemplar.

Aqui mora o impasse central do texto: quem pode ser anistiado? Há, hoje, três possibilidades em debate nos bastidores. Primeiro, anistia ampla — a preferida da oposição, que incluiria manifestantes e lideranças políticas, inclusive investigados por instigação. Segundo, anistia restrita — defendida por parte do centrão, que protegeria apenas condutas sem violência e sem dano ao patrimônio. Terceiro, anistia com exclusões explícitas — uma lista de crimes que ficariam fora, como financiamento de atos violentos, associação criminosa, liderança de invasões e dano qualificado.

Essa terceira via tem ganhado impulso. Aliados de Paulinho da Força dizem que uma anistia “cirúrgica” reduziria atritos com o STF e acomodaria a narrativa da pacificação sem passar a mensagem de impunidade. Ao mesmo tempo, não atenderia integralmente o desejo de blindagem de todas as figuras mais expostas do bolsonarismo.

O governo observa com cautela. Publicamente, líderes da base falam em “defender a democracia” e rejeitam qualquer perdão que abranja destruidores e financiadores dos ataques. Reservadamente, gente do Planalto admite discutir um texto mais enxuto, desde que preserve a responsabilização de cabeças e organizadores. É uma equação delicada: ceder demais pode gerar desgaste com o eleitorado progressista; endurecer demais pode unir de vez a oposição.

Do ponto de vista jurídico, o Congresso pode conceder anistia por lei. A tradição brasileira tem exemplos que vão de disputas políticas locais a processos eleitorais, mas o tema sempre levanta dúvidas: a anistia pode alcançar crimes comuns? Onde traçar a linha entre crime político e crime contra as instituições? Penalistas lembram que, via de regra, crimes com violência, dano e associação criminosa não deveriam entrar. Caberá ao relator escrever isso com clareza, se essa for a escolha.

Se o mérito for aprovado na Câmara, o projeto segue para o Senado. Lá, o clima é mais frio, mas a pressão será forte. Passando nas duas Casas, o texto vai à sanção presidencial. O governo pode vetar trechos, e o Congresso pode derrubar o veto. Depois disso, o Supremo ainda pode ser acionado para avaliar constitucionalidade e alcance do perdão. Nada simples.

Até a votação do mérito, os próximos movimentos já estão no radar: ouvir bancadas da segurança pública, negociar com líderes do centrão ajustes no escopo, alinhar com o Senado uma redação de consenso e medir a temperatura do Supremo para evitar um choque institucional. A urgência abriu a porta; agora a disputa é sobre o tamanho do perdão e quem exatamente passará por ela.

O que está em jogo: escopo, impactos e próximos passos

O que está em jogo: escopo, impactos e próximos passos

O texto de Crivella, como chegou à Câmara, cobre manifestações de motivação política ou eleitoral a partir de 30 de outubro de 2022. Na prática, isso inclui desde bloqueios de rodovias após o segundo turno até atos e caravanas de janeiro em Brasília. O ponto sensível é a conexão com a intentona de 8/1: a partir de que momento um ato deixa de ser manifestação política e vira crime contra a ordem democrática?

Para reduzir atritos, interlocutores de Paulinho estudam uma fórmula com marcadores objetivos: excluir quem foi flagrado destruindo, quem financiou logística de invasões, quem organizou caravanas com instruções para romper barreiras, e quem instigou invasão de prédios públicos. Entrariam apenas casos sem violência e sem dano, com participação lateral e sem vínculo com organização. A redação fina desses critérios será decisiva.

Há, ainda, a política eleitoral. A oposição quer mostrar serviço ao seu eleitorado e reconstruir pontes com setores que se sentiram perseguidos. Governistas querem consolidar a narrativa de defesa da democracia e evitar dar munição a rivais para 2026. O centrão, como sempre, negocia espaço, emendas e protagonismo — e tenta sair como fiador de um acordo “responsável”.

Enquanto isso, as defesas de réus seguem apostando em recursos, revisões de penas e diferenciação de condutas no STF. Uma anistia bem calibrada pode encerrar milhares de processos menores e concentrar esforços nos casos mais graves. Uma anistia ampla demais, porém, pode acender alerta vermelho em setores do Judiciário e ampliar o desgaste institucional.

O roteiro provável nas próximas semanas: audiências informais, rascunho de relatório com salvaguardas, checagem de votos bancada a bancada e tentativa de votação ainda neste mês. Se o texto ficar mais enxuto, a chance de aprovação cresce. Se for amplo, a conta fica mais apertada e o placar, imprevisível.

9 Comentários

  • Ernando Gomes
    Ernando Gomes

    Essa urgência é um absurdo. Anistia sem critério é perda de tempo. Eles querem apagar o que aconteceu, mas a sociedade não esquece.

    Quem financiou, organizou e incitou violência não pode ser anistiado. Isso não é justiça, é covardia política.

  • Patrícia Gallo
    Patrícia Gallo

    Acho que o verdadeiro problema aqui não é só o projeto, mas o que ele revela sobre o nosso sistema: a política sempre busca o caminho mais fácil para resolver o que deveria ser resolvido com coragem.

    Se a democracia precisa de anistia para se curar, talvez ela já esteja doente demais.

    Não se cura uma ferida aberta com um pano sujo - se você cobrir o sangue, ele só vai escorrer por baixo.

    Quem cometeu crimes contra as instituições não merece perdão, merece julgamento.

    E se o Congresso não tem coragem de julgar, então que pelo menos não se disfarce de curador.

    Isso aqui é um espetáculo de teatro político, e nós somos o público que paga o ingresso pra ver a mentira dançar no palco.

    Se querem paz, que façam justiça.

    Paz sem verdade é apenas silêncio forçado.

    E silêncio forçado é o berço da próxima ditadura.

    Não me venham com discurso de pacificação enquanto o povo que foi violado ainda sangra.

    Se a anistia for ampla, o Brasil vai voltar a se dividir - só que agora, com menos respeito e mais ódio.

    Quem quer apagar a história, não quer construir o futuro.

    Quem quer justiça, quer memória.

    E memória não é vingança. Memória é o que nos impede de repetir os erros.

  • Murillo Assad
    Murillo Assad

    Ah, claro! Paulinho da Força como relator? Perfeito. Agora é só botar um cartaz na porta do plenário: 'Aqui se anistia, se esquece e se vota em 2026'. 😂

    Se o cara é o cara que faz críticas ao governo quando quer marcar posição, então tá tudo certo - ele vai botar um filtro que deixa todos os aliados de fora, e os inimigos no lixo.

    É o mesmo jogo de sempre: quem tem poder define o que é crime e o que é 'manifestação legítima'.

    Se eu fosse um manifestante de 8/1, já tava com o passaporte na mão.

    Porque aqui, no Brasil, a justiça é como Netflix: só funciona se você paga a assinatura certa.

  • Marcos Suliveres
    Marcos Suliveres

    Cara, isso aqui é o fim da picada. 🤦‍♂️

    Se o Congresso anistia quem invadiu o Congresso, onde é que a gente põe o limite?

    Daqui a pouco, o STF vai ter que anistiar quem invadiu a Corte também.

    É tipo um jogo de dominó: se você empurra um, todo o sistema cai.

    E o pior? A gente já viu isso antes.

    Na ditadura, anistiaram os torturadores.

    Agora vão anistiar os que quebraram as portas da democracia.

    É o mesmo script, só muda o nome dos atores. 😔

    Se a gente não fizer algo, amanhã o que vai sobrar é só um monte de ruínas e um monte de discursos bonitos sobre 'pacificação'.

    Eu não quero paz. Quero justiça.

    E se a justiça não vier, então que venha a memória.

    Porque sem memória, não temos identidade.

    E sem identidade, não temos nação.

  • João Paulo Moreira
    João Paulo Moreira

    essa anistia é uma bosta. quem quebrou o que, vai ser livre? q merda é essa? eu quero justiça nao esquecimento. bolsonaro ta na mira e eles querem proteger ele. pq? pq ele é o chefe? pq ele ta no poder? nao. pq ele ta no poder e eles tem medo. isso é covardia. voto nesse projeto? nem sonho.

  • Bruno Pacheco
    Bruno Pacheco

    a democracia é uma farsa e a anistia é o último suspiro dela. quem vota nisso é um traidor. o povo quer justiça mas a elite quer silencio. a verdade é que ninguem quer saber de verdade. só querem poder. e se a gente não fizer nada, tudo vai continuar igual. porque a história não se repete, ela só se esquece. e isso é pior. porque quando a gente esquece, a gente se torna o que odeia. e eu não quero ser isso. mas se ninguém fizer nada, eu vou ser. e não vou nem lembrar que um dia quis ser diferente

  • renato cordeiro
    renato cordeiro

    A concessão de anistia por via legislativa, no contexto da ordem democrática brasileira, configura um precedente jurídico de extrema gravidade, na medida em que potencialmente viola o princípio da individualização da pena, consagrado no artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal.

    Ademais, a anistia abrangente, tal como proposta, contraria os princípios da legalidade, da moralidade administrativa e da dignidade da pessoa humana, conforme os artigos 1º, III, e 5º, XLIII, da Carta Magna.

    É imperativo ressaltar que os atos de destruição de patrimônio público e de incitação à violência institucional não constituem crimes políticos, mas delitos comuns, nos termos da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

    A tentativa de equiparar manifestações civis a crimes contra a ordem democrática é, por sua vez, uma falácia retórica que desconsidera o núcleo essencial da democracia: a proteção das instituições como pilares da soberania popular.

    Portanto, qualquer redação que não exclua expressamente os autores de atos de vandalismo, financiamento de invasões e associação criminosa, viola o dever constitucional de proteção ao Estado de Direito.

    A pacificação não se alcança com impunidade, mas com responsabilização.

    E a responsabilização, por sua vez, exige clareza jurídica, não ambiguidade política.

  • Gessica Ayala
    Gessica Ayala

    O que está em jogo não é só um projeto de lei - é um teste de alma coletiva.

    Quando você anistia, você não está perdendo um processo, você está perdendo uma narrativa.

    E a narrativa que estamos construindo agora vai ser a que as próximas gerações vão aprender na escola.

    Queremos que elas aprendam que a violência é um meio político? Ou que a democracia se defende com coragem, não com códigos de desculpas?

    Se a anistia for cirúrgica, talvez seja um ato de sabedoria.

    Se for um tapete vermelho para todos, será um sinal de que a nossa sociedade já desistiu de ser grande.

    É um momento de escolha entre dois caminhos: o da memória ou o da amnésia.

    Eu não quero viver num país que apaga os seus erros.

    Quero viver num país que os enfrenta.

    E se isso significa que alguns vão ficar de fora da anistia? Que seja.

    Porque a verdadeira liberdade não é a ausência de consequências.

    É a coragem de assumir as suas.

  • Mario Lobato da Costa
    Mario Lobato da Costa

    esse projeto é uma traição. quem quebrou o congresso é inimigo do brasil. anistia pra eles? nem pensar. isso é sinal de fraqueza. o povo quer punição, não perdão. se o congresso aprovar isso, eu voto em quem prometer mandar o exército tomar conta. não quero mais essa merda de democracia fraca. o brasil precisa de força, não de anistia.

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